Cultivo sustentável de mandioca ganha terreno em Santa Catarina

Com tecnologia e uma forte parceria entre agricultores, pesquisadores e extensionistas, a produção catarinense de mandioca se torna cada vez mais sustentável e rentável. A fórmula de sucesso desenvolvida pela Epagri reúne um conjunto de boas práticas de produção que permitem alcançar produtividade 28% superior à média do Estado e praticamente o dobro da média nacional.

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Boas práticas no cultivo de mandioca aliam alta produtividade e conservação do solo e da água

Já são mais de 1,2 mil hectares cultivados com mandioca de acordo com as boas práticas de produção, incluindo tecnologias como sistema de plantio direto, uso de plantas de cobertura e manejo da fertilidade do solo. O que impulsiona essas transformações é a Rede Maní – uma rede que integra todo o setor para compartilhar conhecimento e desenvolver soluções para a cadeia produtiva.

Responsável por um faturamento anual de R$331 milhões, o cultivo de mandioca para indústria e mesa (aipim) está presente em 12,9 mil hectares de lavouras em Santa Catarina. A produtividade média no Estado é de 21,7t/ha. O objetivo da Epagri é elevar esse índice com práticas que garantam a conservação do solo e da água, oferecendo alimentos de qualidade para o consumidor e melhorando a vida dos agricultores.

Conforto das plantas

Nesse caminho sustentável, o plantio direto ganha terreno ano após ano. O sistema funciona como uma transição da agricultura convencional para a agroecológica, pois, conforme se avança no processo, o uso de agroquímicos na lavoura se torna menor.

O plantio direto promove o conforto das plantas para que elas respondam com saúde e produtividade. Para isso, o agricultor adota práticas como cultivo de plantas de cobertura para proteção permanente do solo com palhada, revolvimento restrito à linha de plantio, rotação de culturas e nutrição baseada nas taxas de absorção de nutrientes.

Nas unidades de referência acompanhadas pela Epagri, que correspondem a cerca de 149ha de cultivo de mandioca em plantio direto, a produtividade média é de 32,5t/ha, enquanto a média no cultivo convencional é de 21t/ha. Nessas unidades, também há redução de aproximadamente 50% na aplicação de herbicidas.

... Plantio direto de mandioca funciona como uma transição da agricultura convencional para a agroecológica

O plantio direto é uma das tecnologias que integram o Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono ABC+SC, construído pela Secretaria de Estado da Agricultura e Pecuária para tornar a agricultura catarinense mais sustentável e adaptada às mudanças climáticas. A meta é, até 2030, aumentar em 126 mil hectares a área manejada sob Sistema Plantio Direto (SPD) e em 7,7 mil hectares a área manejada sob Sistema de Plantio Direto de Hortaliças (SPDH). Estima-se que o SPDH possa contribuir na acumulação de 62 toneladas de carbono por hectare num período de oito anos.

Plantas de cobertura

No plantio direto, as plantas de cobertura, também conhecidas como adubos verdes, têm papel estratégico. Elas são plantadas na área da lavoura e nela permanecem na forma de palha, melhorando as condições físicas, químicas e biológicas do solo. Entre outros benefícios, elas formam matéria orgânica, retêm o carbono da atmosfera no solo, fornecem nutrientes para as culturas, evitam a erosão e a evaporação da água do solo.

Em 2023, as plantas de cobertura revelaram todo seu poder no combate à erosão em lavouras catarinenses onde ocorreram fortes chuvas. Mesmo em locais com intensidade superior a 50mm/hora, as áreas em plantio direto de mandioca permaneceram protegidas e sem perdas.

... Plantas de cobertura permanecem na área da lavoura na forma de palha, conservando e melhorando as condições do solo

Adubação e correção

Outro fator que impacta na produção catarinense de mandioca é o manejo da fertilidade do solo. As indicações técnicas da Epagri ajudam o produtor a definir quais corretivos e fertilizantes usar com base no custo e no benefício do nutriente, além das doses, dos momentos e das formas de aplicação.

Para tornar essas recomendações mais precisas e ágeis, a Epagri desenvolveu o software AdubaManí. O programa permite, em poucos minutos, interpretar a análise de solo e recomendar o uso de corretivos e fertilizantes com precisão e economia.

Esse trabalho tem gerado ganhos de produtividade, redução de custos e melhoria ambiental nas lavouras. “Com a correta recomendação de adubação, é possível alcançar ganhos significativos em produtividade e atingir a meta de 30 toneladas por hectare, elevando a média estadual”, explica o engenheiro-agrônomo Darlan Marchesi, coordenador do programa de Olericultura da Epagri na extensão rural.

Sinergia em rede

Mas essas tecnologias não teriam o impacto necessário nas lavouras sem a participação dos produtores rurais. Por isso, o projeto Rede Maní segue metas definidas em grupo, unindo agricultores, pesquisadores e extensionistas.

Na área da pesquisa, são as necessidades da cadeia produtiva que definem as linhas de estudo, e os agricultores têm participação ativa no desenvolvimento das tecnologias. Na extensão rural, a rede estimula a confiança e o engajamento das famílias. “A rede descentralizou o trabalho na Epagri: cada unidade da Empresa se comunica com as outras, multiplicando e trocando materiais, como ramas, e compartilhando informações e resultados", explica Darlan. Dentro da rede, os produtores também interagem uns com os outros em eventos de capacitação, análise de resultados e atualização técnica.

... Os agricultores têm papel ativo no desenvolvimento das tecnologias da Epagri para a produção de mandioca

Avaliação participativa

O alcance do trabalho em rede pode ser medido pelo crescimento do banco de germoplasma de mandioca da Epagri. Isso acontece graças à contribuição dos agricultores, que fornecem variedades selecionadas em suas propriedades para serem avaliadas pela rede. “Antes, tínhamos 30 a 40 variedades de mandioca em avaliação nas Unidades de Referência Técnica, e hoje são mais de 180”, conta Darlan. Ele explica que, depois de avaliados, esses materiais podem vir a ser recomendados para os agricultores. Além disso, são uma grande contribuição para as pesquisas no trabalho de melhoramento genético.

As variedades de mandioca em avaliação são cultivadas em 41 Unidades de Referência Técnica distribuídas pelo Estado. As URTs são propriedades-modelo acompanhadas pela Epagri que servem de “vitrine” para outros produtores. Nesses locais, que geralmente sediam eventos como dias de campo, os produtores podem verificar na prática os resultados das tecnologias adotadas.

... Cultivo de mandioca para indústria e mesa (aipim) abrange 12,9 mil hectares de lavouras em Santa Catarina

Nas oficinas de avaliação de cultivares de mandioca realizadas nas URTs, os agricultores avaliam os materiais desde a lavoura até o prato. Nesses encontros, as raízes são colhidas, descascadas, cozidas e degustadas e cada participante dá sua nota. Eles observam parâmetros como resistência a doenças e à estiagem, produtividade, facilidade de arranquio, qualidade das raízes, facilidade de descascamento, tempo de cozimento, sabor, consistência e aparência.

Foco nos jovens

Santa Catarina produz mandioca para mesa (aipim) nas regiões Litoral Norte e Sul, Alto Vale Itajaí, Oeste e Extremo Oeste. Já a produção para a indústria de farinha está concentrada no Litoral Sul Catarinense e na Grande Florianópolis. Levando em conta as características de cada região, em 2023, a Epagri atendeu 4 mil famílias e 248 entidades sobre a produção de mandioca. Ao longo do ano, foram realizados 235 eventos, como cursos e dias de campo, somando mais de 3,5 mil participantes.

Os jovens rurais são um público estratégico, por isso a Epagri oferece a eles cursos específicos sobre produção de mandioca. Em 2023, 643 jovens foram capacitados nas regiões de Tubarão e Criciúma. O objetivo é despertar neles a liderança e incentivar a sucessão familiar qualificada nas propriedades. No mesmo ano, 1.622 mulheres rurais do Oeste Catarinense participaram de cursos sobre o uso da mandioca na alimentação.

Qualidade no DNA

Mesmo que a cadeia produtiva seja engajada e todas as tecnologias de cultivo sejam adotadas nas lavouras, ainda há um fator decisivo para garantir a competitividade da produção: a qualidade do que se planta. Os agricultores precisam de plantas produtivas, resistentes a doenças e que facilitem o manejo. Aí é que entra o trabalho de melhoramento genético. Na Epagri, a Estação Experimental de Urussanga, localizada no sul do estado, é a unidade que desenvolve os cultivares de mandioca de alta qualidade que são disponibilizados para a cadeia produtiva.

Um dos maiores sucessos é a mandioca ‘SCS254 Sambaqui’, lançada em 2014. Esse cultivar agradou a cadeia produtiva porque tem alto teor de amido na raiz e rende cerca de 30% a mais de farinha que as variedades usualmente plantadas no Estado. A Sambaqui já ocupa 1,6 mil hectares de lavouras e responde por 24% da área plantada com mandioca para indústria em Santa Catarina. No Sul Catarinense, que é a principal região produtora, ela foi cultivada em 46% da área na última safra. Em 2022, esse cultivar gerou impacto econômico de R$9,8 milhões em aumento de produtividade e agregação de valor.

... Mandioca ‘Sambaqui’, desenvolvida pela Epagri, rende 30% a mais de farinha que a média das variedades plantadas no Estado

Novos cultivares

Em 2023, a Epagri registrou dois lançamentos: SCS264 Pompa e SCS265 Serena (que chegarão aos produtores em 2025), e também disponibilizou aos agricultores os cultivares SCS256 Cigana e SCS257 Petuna, lançados em 2022. Voltados para produção de farinha e polvilho, Cigana e Petuna estão na primeira safra comercial e se destacam porque são altamente produtivos e tolerantes a doenças e pragas. Os cultivares também têm alto teor de matéria seca nas raízes e oferecem rendimento elevado para a indústria. “Ambos têm hastes retas, o que favorece o transporte, o plantio e o armazenamento, além de facilitar a condução da lavoura”, explica o pesquisador Alexsander Moreto, da Epagri. A mandioca ‘Cigana’ é indicada para plantio no Alto Vale do Itajaí e no Litoral Catarinense e a ‘Petuna’ é indicada para o Alto Vale do Itajaí.

Uma característica desses quatro últimos lançamentos da Epagri mostra como a união com a cadeia produtiva é importante. Todos esses cultivares têm ciclo vegetativo de dois anos, atendendo a um pedido dos agricultores e das indústrias de farinha, que precisavam de mais flexibilidade no período de colheita. Agora, os produtores podem organizar a colheita de acordo com o mercado, sem perder a qualidade das raízes. A sinergia entre pesquisa, extensão e cadeia produtiva fecha um ciclo e quem ganha com isso é a sociedade.

Plantio direto melhora a qualidade do solo em lavouras de mandioca de Araranguá

Com mil hectares cultivados, Araranguá, no Sul Catarinense, tem forte tradição na produção de mandioca. Mas um desafio que os produtores enfrentam na região são os solos arenosos e bastante frágeis do ponto de vista estrutural e de fertilidade. “A produtividade média em Araranguá está em 22 toneladas por hectare; porém, foi possível elevar para mais de 28t/ha ao utilizar as boas práticas de produção e melhorias no manejo do solo”, explica a engenheira-agrônoma da Epagri Luciana Ferro Schneider.

Os resultados são visíveis na propriedade de Edilson e Lucilene Custódio, que iniciaram o plantio direto em 2023, semeando aveia-preta como cobertura de solo em 35% da área da lavoura. “A gente tinha muito problema com o solo arenoso. Logo após o plantio da mandioca, o vento levava a areia e ‘queimava’ a planta recém-nascida, que ficava desprotegida.

... Em uma região com vento e solo arenoso, Edilson aprendeu com a Epagri que o plantio direto protege as plantas desde pequenas

Agora, a palha das plantas de cobertura protege e segura o solo na lavoura. Desta vez, a mandioca se desenvolveu muito bem”, conta Edilson. A cobertura do solo também reduziu a presença de plantas daninhas na lavoura. “Em relação ao plantio convencional, a área de plantio direto está muito mais limpa. As plantas estão saudáveis e a colheita deve ser muito boa. O solo é nosso bem mais importante e precisamos cuidar dele do jeito certo”, diz o agricultor.

A extensionista Luciana explica que o plantio direto é a melhor alternativa para adicionar carbono ao sistema agrícola, proteger os solos e aumentar o teor de matéria orgânica. “Isso possibilita reduzir uso de herbicidas e adubações nas áreas ao longo do tempo e também aumentar produtividade e a rentabilidade para os agricultores”, detalha.

Na propriedade de Edilson e Lucilene, 32 hectares de lavouras são cultivados com mandioca para farinha. Outros 2,5 hectares são de mandioca de mesa. A colheita varia de 300 a 400 toneladas em ciclos de dois anos. Entre as variedades plantadas, algumas são da Epagri, como Luna, Sambaqui, Cigana e Petuna. “São variedades muito boas e bem produtivas. Utilizo algumas de um ciclo e algumas de dois ciclos”, diz o agricultor.

     

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