Elas entram como “mulheres de pescador” e saem pescadoras. É assim que o curso Mulheres em Ação “Flor-e-ser”, oferecido pela Epagri, está transformando a vida de mulheres do litoral catarinense. Ao longo da capacitação, com encontros que envolvem muito conhecimento e troca de experiências, um processo de confiança vai ampliando a visão de cada participante sobre sua capacidade de empreender, se profissionalizar e liderar dentro da cadeia produtiva.
O primeiro curso da empresa para pescadoras iniciou em 2020 e terminou apenas em 2021, pois precisou ser adiado com a chegada da pandemia. Nessa iniciativa, 20 mulheres se formaram nos Centros de Treinamento da Epagri em Joinville, no Norte Catarinense, e em Tubarão, no Sul do Estado. E em 2022, mais 70 pescadoras de municípios do litoral foram capacitadas nos Centros de Treinamento de Tubarão, Itajaí e Florianópolis. O curso é gratuito, custeado pela Secretaria de Estado da Agricultura.
Formação integral
A capacitação é distribuída em cinco encontros de dois dias e abrange os eixos social, humano, ambiental e de empreendedorismo. Ao longo das etapas, as participantes aprendem sobre políticas públicas para mulheres, cooperativismo, oportunidades de renda e negócio, educação financeira, turismo e artesanato, por exemplo. Na área da pesca, o conteúdo inclui cuidados na manipulação do pescado, segurança de navegação, legalização da atividade, biologia marinha, mapeamento de áreas de pesca e outros temas. Com conhecimento na bagagem, as mulheres passam a valorizar suas funções e se reconhecer na profissão, fortalecendo suas identidades como pescadoras.
Dentro do curso, as participantes ainda desenvolvem planos de negócio para acessar o Programa Realiza, uma linha de crédito que oferece até R$30 mil para pagar em cinco anos sem juros, com 10% de desconto para pagamentos em dia. Esse programa da Secretaria da Agricultura estimula o empreendedorismo e a independência financeira de jovens e mulheres do campo e do mar em Santa Catarina. Na área da pesca, os recursos viabilizam a construção de agroindústrias, ranchos de pesca, e a compra de barcos e equipamentos, por exemplo, melhorando a renda das famílias.
Apoio no campo e no mar
O trabalho com as mulheres dos meios rural e pesqueiro é histórico na Epagri. A empresa atua na capacitação e no acompanhamento desse público, buscando qualificá-las para a inserção no mercado e para que elas assumam espaços estratégicos em seus setores. Apenas em 2022, 67 mil mulheres foram atendidas pela empresa em todas as regiões catarinenses.
No mesmo ano, dos 3,4 mil projetos de crédito elaborados pela Epagri, 1.570 beneficiaram mulheres da agricultura e da pesca, somando R$50,6 milhões em financiamentos. Entre as pescadoras, foram 29 projetos executados em 2022, somando quase R$1 milhão em recursos para alavancar os empreendimentos de famílias litorâneas.
Com apoio e conhecimento, as pescadoras e agricultoras de Santa Catarina movimentam a economia e descobrem que seu horizonte não termina no quintal de casa. Um resultado visível desse trabalho é o aumento da participação das mulheres como proprietárias de agroindústrias no estado. De acordo com um estudo da Epagri realizado em 2017, a participação feminina era de cerca de 31% nos empreendimentos pesquisados em 2009.
E no grupo das agroindústrias criadas a partir de 2010, as mulheres já eram quase 44% dos proprietários ou sócios. Também é crescente o número de mulheres ocupando espaços de decisão nas instituições ligadas à agricultura e à pesca, como sindicatos, colônias de pescadores, Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDRs), cooperativas e associações.
Pescadora de Penha financia barco para a família e se destaca na comunidade
“Eu era a esposa que ajudava o marido pescador. Depois do curso da Epagri, aprendi que não sou só a mulher que limpa, gela e embala – também sou pescadora, faço parte da atividade e sei a importância do meu trabalho”. O testemunho de Jane Nascimento de Andrade da Silva, de 48 anos, que vive na comunidade de Armação do Itapocorói, em Penha, representa a história de muitas mulheres do litoral catarinense que deixaram de se ver como coadjuvantes na pesca e assumiram o protagonismo em suas casas e comunidades.
Embora o marido tenha relutado um pouco no início, a participação de Jane no curso foi o caminho para melhorar a vida da família inteira. Há quase dez anos, o barco deles havia sido destruído em uma ressaca e, desde então, Jane e o marido trabalhavam para outros pescadores. Com dificuldade financeira, eles não conseguiam adquirir outra embarcação. A volta por cima veio durante o curso, quando Jane elaborou um projeto e conseguiu financiar um casco no valor de R$30 mil para que a família voltasse a ser dona dos meios de produção. “O barco trouxe autonomia financeira para nossa família”, comemora a pescadora.
Nos encontros realizados no Centro de Treinamento da Epagri em Itajaí ao longo de 2022, Jane se capacitou e ganhou autoconfiança. A assessoria e o acompanhamento da Epagri entre as etapas do curso foram fundamentais para concretizar as mudanças na vida e no trabalho dela. “Que bom que alguém se lembrou de fazer um curso para mulheres da pesca. Minha vida era em casa, manipulando peixe e camarão, cuidando do lar e dos filhos. No curso eu fiz amizades e aprendi muita coisa que me ajudou a crescer como pessoa”, conta.
As aulas sobre finanças, para Jane, foram as mais proveitosas, pois ajudaram na tarefa de cuidar da comercialização do pescado e da contabilidade do negócio. A família pesca cerca de 100kg de camarão por semana e vende para restaurantes, peixarias e consumidores finais. Em época de defeso, pesca peixe e siri.
Fora de casa e do barco, Jane vem se destacando como uma liderança na comunidade. Ela passou a participar das reuniões do sindicato dos pescadores e também de encontros com mulheres do litoral. “Quando estamos juntas, a gente se fortalece. No futuro, pensamos em criar uma cooperativa”, conta.
Acesse o Balanço Social da Epagri para saber mais sobre esta e outras histórias de sucesso.
Escrita por: Cinthia Andruchak Freitas
Conheça o projeto “Flor e ser”, que qualifica as mulheres para que elas ocupem posições estratégicas na agricultura e na pesca: