A água que cai do céu, de graça e algumas vezes abundante, garante a existência da vida como conhecemos. Humanos, animais, plantas, todos dependem deste recurso natural para sobreviver. Para marcar a passagem deste 22 de março, Dia Mundial da Água, a Epagri apresenta algumas ações que vem realizando há décadas, visando a preservação deste recurso natural.
Seguindo a velha máxima de que é preciso conhecer para preservar, a Epagri se dedica a aprofundar cada vez mais os estudos científicos sobre o líquido, bem como monitorar sua distribuição pelo Estado. Paralelamente, os extensionistas da Empresa se empenham em divulgar às famílias agricultoras catarinenses práticas que visam conservá-la.
A presença da água é tão natural na vida das pessoas, que a maioria não reflete sobre a sua essencialidade para a sociedade. “Toda atividade produtiva depende da água”, destaca Guilherme Xavier de Miranda Junior, pesquisador em hidrologia da Epagri.
Ele lembra que não só a agropecuária utiliza o recurso natural para suas atividades rotineiras. Os setores da indústria e de serviços também deixariam de operar sem a presença do líquido. Já pensou em um hospital, hotel, escola ou mesmo uma loja funcionando sem água? As fábricas também deixariam de operar, inclusive porque grande parte delas tem a água como insumo de seus processos produtivos.
Por tudo isso, “há necessidade de se preservar, conservar, armazenar e, principalmente, administrar de maneira eficiente esse recurso natural, que é limitado na natureza”, pondera Guilherme. O primeiro passo é conhecer a realidade da distribuição de água, para que, a partir daí, os órgãos competentes possam tomar decisões embasadas em dados confiáveis e estabelecer políticas públicas que ajudem a democratizar o uso do precioso líquido.
Mistérios da água desvendados em SC
Santa Catarina tem as ferramentas necessárias para desvendar os mistérios da água. O banco de dados do Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia de Santa Catarina (Epagri/Ciram) reúne, desde 1911, resumos mensais do regime de chuvas no Estado. A partir de 1948 esses registros começaram a ser diários. Hoje, o Centro administra uma rede formada por 311 estações hidrometeorológicas ou meterológicas automáticas que medem, a maioria em intervalos de 15 minutos, diferentes variáveis ambientais do Estado, entre elas níveis de chuva e de rios.
Graças a essa rede, o banco digital da Epagri/Ciram recebe diariamente cerca de 90 mil novos dados a cada dia. Os dados são enviados, a cada hora e de forma automática, ao datacenter da instituição, que fica em Florianópolis. Lá eles são automaticamente qualificados e publicados em tempo quase real no site do Centro.
Esse banco representa um patrimônio inestimável para os catarinenses e brasileiros. Ele permite, entre outros fatores, saber que a região Oeste do Estado, conhecida por ser atingida periodicamente por estiagens, é a segunda com maior média anual de chuva em Santa Catarina.
Segundo Maria Laura Guimarães Rodrigues, coordenadora do setor de meteorologia da Epagri/Ciram, o Litoral Norte, que é a região mais chuvosa do Estado, acumula uma média que varia entre 2,3 mil e 2,5 mil milímetros de chuva por ano. Em seguida aparece o Oeste, com média de 1,9 mil milímetros anuais. O Litoral Sul acumula o menor índice de chuva de Santa Catarina, com média anual que varia entre 1,3 mil e 1,5 mil milímetros ao ano.
Apesar dos volumes altos, a chuva no Oeste de Santa Catarina acontece de forma irregular no tempo e no espaço. Ou seja, chove, mas em períodos e lugares concentrados, resultando em ciclos de estiagens com potencial de prejudicar a produção agropecuária, que tem grande importância econômica e social para a região. Por isso a necessidade de coletar e reservar a água da chuva, que se torna ainda mais fundamental nas comunidades rurais, que demandam expressivos volumes do líquido para produzir o alimento que chega à mesa dos moradores dos meios urbanos.
Cisternas para conviver com mudanças climáticas
E aí entra mais uma vez o trabalho da Epagri e da Secretaria de Estado da Agricultura (SAR). Valendo-se da informação de que há sim chuva suficiente no Estado, a Secretaria disponibilizou e a Epagri executou políticas públicas que permitem ao agricultor familiar coletar e reservar a água que cai de graça em sua propriedade.
Hoilson Fogolari, coordenador de políticas públicas da Epagri, revela que, em 2022, os técnicos da Empresa elaboraram quase 2,5 mil projetos de crédito rural para captação, armazenamento e distribuição de água no meio rural. Foram mais de R$91,1 milhões aplicados só no ano passado. “Foram 1.262 cisternas apoiadas, e mais 317 outros tipos de reservatórios de água”, enumera o coordenador.
A Epagri elaborou pelo menos 2.096 projetos dentro do programa Prosolo e Água SC, com previsão de investimentos de mais de R$65 milhões. Hoilson explica que estes recursos são emprestados ao agricultor diretamente pela SAR. Os beneficiários têm cinco anos para pagar, sem juros. Parcelas pagas em dia têm 50% de desconto, portanto, se o agricultor não atrasar, pagará a metade do que recebeu.
Dentro do programa Investe AGRO SC, a Epagri elaborou 328 projetos, com previsão de investimento de mais de R$21,7 milhões por parte dos agricultores. Deste total, o Governo do Estado, através da SAR, subvenciona juros de até 3% ao ano.
A grande adesão dos agricultores catarinenses a estes programas demonstra a preocupação do setor com um cenário que se torna cada vez mais evidente. A meteorologista Maria Laura relata que há estudos comprovando que as mudanças climáticas vão agravar ainda mais a ocorrência de extremos climáticos no território catarinense. Ou seja, os eventos de estiagem e de chuva intensa, que sempre existiram em Santa Catarina, se tornarão cada vez mais intensos e frequentes. O mesmo ocorrerá com a temperatura, resultando em verões mais quentes e invernos mais frios no Estado.
Um dos fatores que propiciam a ocorrência de estiagens no Oeste catarinense é o La Niña, fenômeno natural caracterizado pela diminuição da temperatura da superfície das águas do Oceano Pacífico. No caso de elevação dessa temperatura, acontece o El Niño. Os dois têm capacidade de gerar mudanças significativas nos padrões de precipitação e temperatura ao redor da Terra.
Índice vai calcular risco de estiagens em SC
O setor de hidrologia da Epagri/Ciram fez análise dos episódios de La Niña, El Niño e neutralidade ocorridos desde 1950. A avaliação constatou que em 45,8% do tempo, a situação era de neutralidade, enquanto que em 30,6% do tempo foi constatada ocorrência de La Ninã. Nos 23,3% restantes de tempo, foram registrados períodos de El Niño. “Concluímos que há uma tendência de maior ocorrência de La Niña, que indica o risco de estiagens no Estado, por isso a necessidade de acompanhar de perto essa situação”, contextualiza Guilherme.
Para facilitar esse acompanhamento, o site da Epagri/Ciram vai oferecer em breve, para livre acesso, o Índice Integrado de Seca, calculado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemanden). A ideia é, num primeiro momento, adaptar essa informação para a realidade da agricultura e hidrologia de Santa Catarina. “Futuramente, vamos disponibilizar um Índice integrado de estiagem para nosso Estado, calculado pela Epagri/Ciram”, revela o pesquisador.
“Com a nova ferramenta, vamos poder fazer previsão de estiagem no território catarinense para cinco, 10 e 15 dias”, esclarece Guilherme. Será possível informar à sociedade se a chuva prevista nos próximos dias será suficiente para resolver eventuais estiagens em andamento.
O pesquisador em hidrologia da Epagri/Ciram explica que a estiagem se diferencia da seca pelo período consecutivo de dias sem chuva. No caso da seca, há ocorrência de meses a até anos seguidos sem chuva, o que não acontece em Santa Catarina. A estiagem se caracteriza por períodos de 15, 20 dias sem precipitação, intercalados por episódios chuvosos, que podem ou não modificar a situação.
A Epagri/Ciram criou o setor de hidrologia há 10 anos, desde quando vem monitorando uma média de 50 pontos de rios em Santa Catarina, em parceria com a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). Guilherme, que coordena o setor, explica que há 23 anos a Empresa trabalha em conjunto com a ANA, o que permite a formação de séries históricas que embasam pesquisas sobre a realidade hídrica catarinense.
Práticas conservacionistas para preservação da água
O solo preservado funciona como um reservatório de água. É com essa ideia que a extensão rural da Epagri orienta as famílias rurais para tornar a agricultura catarinense cada vez mais sustentável. A missão é disseminar boas práticas que preservam o solo e a água e trazem mais conforto para as plantas e os animais, mesmo durante a estiagem.
Uma delas é o plantio direto, um sistema em que o solo permanece protegido por plantas e seus resíduos, como a palhada, trazendo benefícios para a agricultura, natureza e a sociedade.
Outra prática é o terraceamento, com estruturas construídas em nível, planejadas para reter a água da chuva dentro da lavoura. Essa técnica, presente em 1,7 mil hectares no Estado, elimina definitivamente o risco de erosão e faz com que a água da chuva penetre no solo e fique disponível para as plantas em períodos de escassez hídrica.
Além disso, a Epagri estimula de diversas formas a recuperação de matas ciliares e a proteção de nascentes, que se unem a outras práticas conservacionistas e tornam o meio rural catarinense um exemplo de preservação de água.
A Organização das Nações Unidas definiu como tema para o Dia Mundial da Água 2023 “Acelerando Mudanças – Seja a mudança que você deseja ver no Mundo”. Ela usa para isso a fábula do beija-flor, que apaga o incêndio carregando gotas de água em seu bico. A Epagri se orgulha de ter uma revoada de colibris – formada por pesquisadores, extensionistas e produtores rurais – empenhada em preservar a água para o bem de toda a humanidade.
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Gisele Dias, jornalista
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